sexta-feira, 2 de março de 2012

Peruano ajuda inventores com cursos de criatividade e patentes


'Inventar Peru' auxilia inventores iniciantes e faz oficinas em escolas.
Série do G1 mostra empreendedores sociais pelo mundo.

Giovana SanchezDo G1, em São Paulo
Juan Carlos Aguilar, inventor peruano (Foto: Arquivo pessoal)Juan Carlos Aguilar (Foto: Arquivo pessoal)
No meio da década de 1990, o inventor peruano Juan Carlos Aguilar decidiu deixar a capital Lima e ir para um lugar calmo que lhe desse espaço, tempo e tranquilidade para pensar nos seus inventos. Em pouco tempo, ele achou uma comunidade rural que tinha tudo o que precisava. Mudou-se para lá e adorou o lugar. Gostou tanto que "sem querer" virou líder comunitário.
Como ativista, Juan participava das reuniões para tentar resolver os problemas da comunidade. "Nos encontros, as pessoas comentavam sobre as dificuldades, como por exemplo: havia muita água, mas estava debaixo da terra e as pessoas não tinham água pra consumir!"
Como inventor, Juan começou a perceber que poderia aliar sua profissão com a ajuda social. Reuniu os materiais que existiam naquela região e organizou oficinas para encontrar soluções tecnológicas para as questões que os moradores enfrentavam - como por exemplo uma bomba com pedais de bicicleta e um purificador de água.
A iniciativa deu tão certo que em 2000 Juan montou a Inventar Peru (site em espanhol), uma organização que oferece gratuitamente informações, dicas e cursos de criatividade para quem tem alguma ideia, quer desenvolver-se na área ou mesmo para qualquer estudante. "O verdadeiro valor que temos é nosso próprio conhecimento e as habilidades para aplicar em nosso próprio benefício."
G1 - Você é inventor desde criança?
Juan Carlos Aguilar - Sim, sou inventor desde criança. Inventava meus próprios brinquedos, buscava soluções técnicas para problemas da vida cotidiana usando objetos de casa. É uma atividade que me acompanhou por toda a minha vida. No começo, considerava um hobby, algo que podia fazer nos tempos livres, mas aos poucos foi ocupando mais tempo na minha vida, quase por acidente, sem programar. Quando estava mais velho, me dei conta de que era minha verdadeira paixão, minha vocação e que deveria me dedicar mais. Então comecei a inventar coisas de um nível mais profissional. Aí, ganhei alguns prêmios, reconhecimentos importantes. Conheci um pouco do mundo graças a isso.
G1 - Você poderia falar sobre alguns de seus inventos?
Juan -
 Eu os categorizo em duas formas: há os inventos comerciais, que são aqueles que estão destinados a gerar dinheiro, e há os inventos sociais, que estão um pouco mais focados em solucionar problemas da sociedade. Foi assim que nasceu meu empreendimento social. Pois ao mesmo tempo em que fazia os inventos eu me envolvi com o ativismo social e encontrei um ponto de conjuntura. Me dei conta de que poderia juntar a criatividade inventiva com alguma maneira de solucionar problemas que afetavam a sociedade.
Entre os inventos sociais tenho objetos que servem para purificar a água em comunidades rurais e também inventos que servem para monitorar os parâmetros ambientais para projetos sociais, ONGs que trabalham em zonas rurais. Estes últimos são como laboratórios portáteis.
Laboratório portátil inventado por Juan ajuda ONGs a fazerem medição ambiental (Foto: Arquivo pessoal)Laboratório portátil inventado por Juan ajuda ONGs a fazerem medição ambiental (Foto: Arquivo pessoal)
Na área comercial, tenho produtos desenhados para satisfazer algumas necessidades secundárias, não tão importantes, mas que ao mesmo tempo têm um perfil comercial interessante, como algumas ferramentas para uso doméstico, acessórios para levar cargas no teto de carros, coisas desse tipo. Tenho muitos inventos, alguns estão patenteados, outros, não. Eles geram recursos para financiar a parte social. Vendendo algumas ideias com potencial comercial, o que fazemos é gerar renda para criar alguns inventos sociais.
G1 - E como começou a 'Inventar Peru'?
Juan - 
Quando me dei conta de que queria ser inventor profissional, eu me mudei da cidade para uma zona rural de Peru, uma zona com pouco acesso, porque queria ter espaço, tempo e tranquilidade. Eu adorei o lugar. E gostei tanto que fui me envolvendo na problemática das pessoas, da comunidade. Sem querer, virei líder da comunidade, eles me elegeram e eu me senti comprometido a buscar soluções para alguns problemas de lá. Então na metade do tempo dedicava aos meus inventos e na outra metade era líder comunitário. E nas reuniões as pessoas comentavam sobre os problemas, como por exemplo havia muita água, mas estava debaixo da terra e as pessoas não tinham água pra consumir!
Então o que fizemos foi desenhar um sistema de bombeamento, com pedais de bicicleta, para as pessoas tirarem água do subsolo e consumir. Uma vez que a água passou por esse sistema de purificação que falei antes, as pessoas teriam acesso à água potável.
Eu dizia, bom, todos têm seu nível de criatividade. Uns mais do que outros. Mas havia muita gente jovem que tinha muita criatividade tecnológica e só necessitava de um guia. Então eu organizava esses jovens em oficinas e pegava o que tínhamos: madeira, algumas espécies de planta, outras coisas. Juntamos tudo e colocamos em frente a elas os problemas que existiam e como usando esses recursos podíamos pensar soluções tecnológicas. Aí alguém trazia uma bicicleta velha, outro trouxe tubos de plásticos e armamos uma bomba com pedais, entende? 
G1 -  E quando a organização foi criada?
Juan -
 Começou quando a Ashoka [organização mundial que financia empreendedores sociais e suas ideias] descobriu a ideia e decidiu apoiá-la. Aí, formou-se a organização, em 2002.
G1 - Como foi a recepção por parte dos inventores, do que ele mais precisam?
Juan -
 Aqui há que se explicar algo. Primeiro que os inventores são parte da sociedade - e nós trabalhamos também com inventores. Mas a maior parte de nosso público é formada por jovens de escolas, que não são inventores profissionais, mas dão muitas das ideias que movimentam o empreendimento original.
Para os inventores profissionais oferecemos recursos educativos, para que aprendam como patentear um invento, como é o processo inventivo, como transformar uma ideia em algo de valor, que gere dinheiro.
Um dos inventos comerciais de Juan (Foto: Arquivo pessoal)Um dos inventos comerciais de Juan (Foto: Arquivo
pessoal)
Por outro lado, falamos com os jovens, tratando de despertar esse espírito inventivo, para estimular a geração de mais inventores. Pois acreditamos que os inventores são os que geram as ideias que podem mover a economia. Em muitos países, principalmente nos desenvolvidos, que estão gastando mais na criatividade dos recursos humanos do que em materiais, matérias primas. Para nós é importante criar um grupo grande de pessoas que pense a tecnologia e gere ideias para produtos que vão impactar positivamente na economia. Por isso fazemos oficinas para estimular a criatividade dos jovens nas escolas.
G1 - E como é o processo de inventar algo? O que se faz depois que se tem a ideia?
Juan - 
O primeiro de tudo é a ideia. Mas a ideia é muito pouco, se você não a persegue com o processo que vem depois dela. As ideias nós as temos todos, mas poucas pessoas chegam a desenvolver um produto - essa é a diferença entre um inventor e um consumidor.
A primeira coisa é se concentrar nos problemas técnicos. Se algo não está funcionando é preciso pensar formas de melhorar. Aí é onde nasce o processo. Depois que desenvolve um pouco mais a ideia, desenha, você começa a ensaiar alguns protótipos, em geral muito rústicos, mas que servem para balizar a ideia, para ver se funciona. A grande maioria dos inventores para aí, porque o que vem depois requer capacidade que muitas vezes não temos.
Uma vez que tem um protótipo que mostre que sua ideia funciona, vem a parte de investigação de patentes. Precisa saber se o que você fez e construiu já não foi feito em outra parte do mundo. Isso requer uma habilidade no campo de propriedade intelectual que muitos de nós inventores não têm. Se sua ideia existe, é o momento de abandonar e pensar em outra coisa. Senão, começa a fase de patente. Para isso é preciso saber se parte do mundo quer o produto, é preciso focar o mercado. Isso é um trabalho mais de advogado de patentes.
G1 - E vocês oferecem essa ajuda para patentes?
Juan - 
Sim, nós aprendemos o processo de busca de patentes e o processo de patentear e dividimos com os inventores essas informações. Na maioria das vezes, os inventores não podem bancar os custos de um advogado de patentes. Então a ideia não progride, guarda-se ela, porque é caro. E o que fazemos é abrir a informação e ensinar - isso um inventor pode fazer se quiser aprender. E aproveitamos a ajuda de advogados voluntários. Também temos um fórum de inventores para que eles façam perguntas para pessoas capacitadas responderem.
O que queremos que ocorra com isso é que se promova mais a capacidade inventiva, que os inventores tenham mais ideias e possam chegar mais longe com elas. A ideia no fundo sempre vai ser impactar positivamente a economia, que ideias sensíveis aproveitem melhor as matérias primas que produzimos em nosso país e isso se transforme em produtos com valor agregado. Digamos, não só vender aço, mas vender móveis de aço com algum desenho original.
G1 - Quantos inventores lhe procuram por mês mais ou menos?
Juan - 
Temos uma rede de cerca de 150 inventores. Todos estamos conectados pela internet. Por mês eu diria que há 20 a 30 que nos buscam para tirar dúvidas. Outra coisa é a capacitação de jovens nas escolas. Até agora implementamos cerca de 100 oficinas de criatividade e alcançamos até hoje 4 mil jovens. Muitas vezes eles produzem inventos de sucesso, seguindo seu próprio caminho. Temos concursos para premiar as melhores ideias e o prêmio é um dinheiro para financiar o invento.
G1 - Quais as maiores dificuldades que você enfrentou no começo e hoje?
Juan - 
No começo o mais difícil está entre as carências econômicas e mudar a mentalidade das pessoas. Eu diria pessoalmente que o mais difícil é mudar o jeito de pensar das pessoas. No começo ninguém acreditava que daria certo, diziam 'inventos não dão em nada'. Essa foi a maior barreira. Era um desafio fazê-los entender que o verdadeiro valor do que eles tinham era seu próprio conhecimento e suas habilidades.
O segundo obstáculo é sempre a parte econômica. Isso sempre foi um desafio e sempre nos distrai porque não podemos fazer o que queremos. Estamos preocupados buscando maneiras de gerar dinheiro para implementar a ideia.
G1 - E como você se sente pessoalmente em relação à iniciativa?
Juan - 
 Eu me sinto realizado! Muito orgulhoso do que consegui até agora. É difícil explicar, porque muitas vezes esse trabalho me afetou de forma negativa, dedicar tanto esforço, sacrificar tanto, muitas vezes significou afetar minha própria economia, minha harmonia familiar. Eu me entregava muito a isso, mas pouco a pouco fui aprendendo uma maneira de fazer o que eu gosto sem sacrificar tanto minha vida pessoal. Cheguei aos dias de hoje e me sinto orgulhoso, reconfortado, satisfeito. Acho que não poderia ser feliz fazendo algo diferente. 
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